Thursday, November 19, 2009

Sem jeito mandou lembranças

É, não tenho jeito.

Não quero dizer que não tenho solução, mas sim que muitas vezes não tenho jeito pra certas situações.
Hoje foi uma delas.
Uma turma me fez uma homenagem de despedida. São concluintes e cantaram:
"Eu tenho tanto
Prá lhe falar
Mas com palavras
Não sei dizer
Como é grande
O meu amor
Por você...





E não há nada
Prá comparar
Para poder
Lhe explicar
Como é grande
O meu amor
Por você..."

O que fiz? Sorrir, agradecer, chorar?

Nada disso, continuei guardando meu material de trabalho.

Por quê?

Explicações com livros:
Hagakure

Manual samurai do século XVIII
A idéia de dever, de compromisso, de se dever cumprir as regras é algo caro pra mim. Naquele instante, eu estava preocupado em terminar minha atividade como professor - embora feliz com a homenagem, nem pensei em parar meu serviço.

Raízes

Clássico da historiografia do século XX.
Idéia do homem cordial, inserido nas relações sociais. Muitas vezes sou incapaz de me pensar como indivíduo, me penso apenas na rede. Naquele momento, eu era professor, logo, não podia dar vazão a sentimentos.

Civilização

Obra revolucionária que une História, Psicanálise e Sociologia.
Nesse texto Elias mostra como nosso processo de civilização provoca uma interiorização constante e progressiva. Cada vez mais, lidamos com nós mesmos. gostaria que os alunos entendessem meu ponto de vista, mas são incapazes disso, talvez devido a diferença geracional. O que acontece é que embora goste deles e, por vezes, gostem de mim, parecemos estranhos uns para os outros.

Consumo e Romantismo

Texto de referência em sociologia.
Os protestantes são reprimidos e canalizam isso para o consumo, quem é muito controlado, tem sentimentos até mais intensos do que quem os expõe sempre.
Hoje, eu que tanto ansiava por uma demonstração daquele tipo, não pude corresponder a ela. O sentimento estava lá, mas não podendo ser expressado na sua totalidade.

Paixões e Interesses

Como os interesses, paixões mais fracas, podem nos ajudar a dominar paixões mais fortes. Vivi me preocupando em me controlar, para ter a atitude certa, a ação correta na hora exata. Com isso, me enferrujei um pouco, tenho dificuldade de demonstrar esses sentimentos de tão controlados que são. O que não quer dizer que não haja fogo sob as brasas - a turbulência está lá, sob controle.

Vale ressaltar que há alguns que me entendem. Dois alunos conversaram comigo depois, eles me agradeceram e senti que deixei uma imagem boa para alguns, que algo do que eu disse ficou. Fiquei muito feliz, se morresse ontem, morreria feliz. A vida é feita de pequenas coisas assim, que simbolizam grandes sentimentos.

Mais do que as palavras, foi o reconhecimento implícito nas palavras. Ao falarem comigo depois da aula, os dois sabiam que AÍ eu poderia corresponder, agradecer. Sou assim. Muitas vezes me perguntei: "pq sou errado? pq não consigo demonstrar meus sentimentos? pq não posso ser como os outros?" Hoje, mudo minha pergunta: "pq as pessoas não percebem que expresso meus sentimentos de forma diferente?"

Hoje é tudo tão rápido, não há tempo para se compartilhar, se conhecer. Quanto se perde aí? Será que todos devemos cair no turbilhão de emoções expostas, impensadas? Será que essa é a única forma de ser? Será que todos têm que ser assim? Hoje penso que minha forma de ser é quase uma luta política pelo direito de ser diferente. Se há movimento dos sem terra, movimento negro, movimento homossexual, porque não pode haver um movimento dos circunspectos, introspectivos?

Um breve olhar sobre como penso. Jane Austen me entende:


Um olhar da Jane Austen sobre sentimentos velados:



Apesar do jeito torto que recebi a homenagem, ela foi bem recebida e apreciada, ela irá me nutrir por muito tempo. Por causa dela, uma semana complicada do ponto de vista profissional, até um pouco desestimulante, terminou bem.

Me lembrei de uma frase que sintetiza um pouco do que gostaria de deixar como legado de minha atividade como professor:
"Pode ser que tua sombra deixe marcas no caminho
E os vestígios dos teus atos devolva aos fatos o fascínio"

Monday, November 02, 2009

Entre a cordialidade e a individualidade

Ser um entre muitos, indistinto, irreconhecível, indiferenciável.
Ser um no meio de outros iguais, fazer parte de algo maior, estar integrado a outros.


Ser um indivíduo, um ser autônomo, senhor de si, agente, que faz e acontece.
Ser um indivíduo, um ser independente, só, solitário, que luta só e só depende de si.

Ser um ou outro é difícil. E ser os dois? Ainda mais!

Ansiar por companhia querendo ficar só, querer gozar da solidão sem se sentir sozinho, ser autônomo sem ter que depender apenas de si mesmo, ter liberdade para agir sem ter que se preocupar com os outros - mas como se me preocupo com os outros? Não deveria me preocupar primeiro comigo mesmo? Mas não desejo a companhia do outro? Companhia sim, mas invasão não! Mas não quero me sentir fazendo parte de algo, da vida do outro? Não é isso uma invasão?

Perguntas, perguntas, tão poucas respostas... Bauman é que está certo, o mundo escorre em nossas mãos, só nos resta deixá-lo ir, ou tentar agarrar o que pudermos...